O orçamento público tem duas funções principais: planejamento e transparência. Em vez de gastar com as necessidades do momento, o orçamento indica em que itens serão utilizados os recursos públicos no ano seguinte, de forma a que todos se programem para os efeitos das decisões do governo e este possa decidir com antecedência, afim de evitar improvisações e desperdícios.E de transparência, ao sinalizar para a sociedade as prioridades da administração pública, permitindo que diferentes grupos se organizem para apresentar suas reivindicações. O orçamento é público porque trata dos recursos de todos e não de recursos de particulares. Além disso, as decisões
são tomadas em público, sujeitando as escolhas ao escrutínio dos eleitores e da sociedade em geral. Decisões públicas em público, nos termos de Norberto Bobbio.
Destinações de recursos secretas ou sigilosas são, por óbvio, uma exceção. Apenas em hipóteses muito restritas, e por tempo limitado, podem ser admitidas. A regra é a transparência total com o dinheiro público.
É claro que todo planejamento requer a capacidade de adaptação, afinal a vida é repleta de fatos inesperados a demandar ação governamental imediata que não constava no orçamento autorizado. Daí a Constituição ter previsto a possibilidade de créditos adicionais ao longo da execução. O parlamento tem legitimidade plena para participar das decisões orçamentárias, na medida em que a fonte do seu poder é o próprio povo. Essa participação não é apenas para autorizar ou rejeitar a proposta do Poder Executivo, mas envolve também a redefinição de prioridades, anulando parte das propostas do Executivo e incluindo outras despesas no lugar.
Os mesmos pilares do planejamento e da transparência se impõem. Quaisquer iniciativas que imponham opacidade ao orçamento, dificultando o escrutínio público, devem ser rechaçadas porque ferem princípios basilares do governo democrático e da república. No debate brasileiro atual, em que se discute o que os críticos têm denominado de “orçamento secreto”, esses fundamentos devem balizar as discussões: planejamento, transparência radical, participação popular e salutar envolvimento do parlamento.
” O Povo”, 13/11/2021.