Um livro que deve servir de inspiração neste momento difícil em que vivemos é Lords of Finance, de Liaquat Ahamed. É uma análise magistral das origens da Grande Depressão de 1929, de como ela poderia ter sido evitada e superada mais rapidamente se os principais responsáveis pela política econômica tivessem sido mais pragmáticos, deixando de lado ideologias econômicas ultrapassadas.
Os banqueiros centrais dos Estados Unidos, Reino Unido, Alemanha e França mostraram-se excessivamente apegados ao então vigente padrão-ouro, que atrelava o valor de cada moeda a uma determinada quantidade de ouro. Para ampliar a oferta monetária depois de certo patamar era preciso aumentar as reservas em ouro, que ficavam enterradas nos subsolos dos bancos centrais.
A disponibilidade de ouro era, contudo, limitada. Quando foi preciso ampliar a oferta de moeda, oferecendo crédito farto para o sistema bancário e para as empresas, os bancos centrais simplesmente não conseguiram apresentar as respostas adequadas. John Maynard Keynes, então um jovem economista, foi um forte crítico do sistema, alertando para os perigos que ele levaria à economia.
Os fatos que se seguiram mostraram o grande equívoco. Um desemprego brutal, empresas quebrando, uma economia absolutamente esfacelada e sem perspectivas. As consequências sociais foram terríveis, com fome em larga escala, saques, desorganização do sistema produtivo, o que constituiu a matéria-prima para as ditaduras que se seguiram e a Segunda Guerra Mundial.
A pandemia do coronavírus pode ter consequências semelhantes, e até mais graves, se os principais dirigentes mundiais não forem pragmáticos e adotarem as medidas corretas. Ideologia geralmente atrapalha. Nos momentos dramáticos, como o atual, ela pode ser fatal. Por isso, a ajuda aos mais atingidos, a proteção ao emprego e o apoio aos estados e municípios devem ser priorizados, deixando de lado valores importantes em tempos normais, como o equilíbrio das contas públicas, mas absolutamente equivocados em situações dramáticas. Movimentos autoritários costumam se aproveitar do desespero do povo para se afirmar. A serpente não para de pôr seus ovos.
“O Povo”, 09/07/2020