Em uma famosa crônica, George Orwell relata um episódio ocorrido em 1938, que ficou marcado na história pelo inusitado. Dezenas de milhares de americanos acreditaram em uma transmissão de rádio que informava que os marcianos haviam invadido a Terra. Tratava-se da transmissão de uma obra de ficção de Orson Welles, mas que muita gente entendeu como fato. Muitos não ouviram a transmissão, mas confiaram no relato de amigos, vizinhos e familiares, sem nenhuma checagem.
O desespero tomou conta de vastos segmentos da população, na crença de que era o fim da humanidade.
A semelhança com os tempos atuais é evidente. No mundo inteiro, a indústria da desinformação, que sempre existiu, parece exercer contemporaneamente influência comparável aos tempos do auge do fascismo. Muitas pessoas acreditam em qualquer coisa reproduzida nas redes sociais, sem nenhum senso crítico. Vivem em verdadeiras câmaras de eco, que se auto alimenta. Empresas, muitas sediadas no exterior, empregam profissionais de diversas especialidades para produzir notícias com verossimilhança com a realidade, mas falsas em pontos essenciais.
Quando contam com a participação da mídia tradicional ficam ainda mais fortes, claro, mas esta encontra óbvios limites para disseminar mentiras, porque tem proprietários e jornalistas identificados, sujeitos muito mais facilmente ao alcance do Poder Judiciário, que pode lhes impor pesadas sanções e até perda da concessão pública, em casos mais extremos.
Já se documentou a influência desse movimento em eleições, no Brexit e em diversos movimentos políticos mundo afora. No Brasil, facilmente se identifica sua forte presença, que leva muita gente a atitudes ridículas e risíveis, mas também a ações perigosas para a sociedade.
Há diversas tentativas de lidar melhor com isso, a principal estratégia é estimular o senso crítico da população e a verificação constante por diversas fontes. Fácil de falar, difícil de fazer, mas indispensável porque o fenômeno vem solapando os fundamentos da própria democracia.
O Povo”, 10/12/2022.